FLORBELA ESPANCA |
Tenho saudades da carícia dos
teus braços, dos teus braços fortes, dos teus braços carinhosos que me apertam
e que me embalam nas horas alegres, nas horas tristes. Tenho saudades dos teus
beijos, dos nossos grandes beijos que me entontecem e me dão vontade de chorar.
Tenho saudades das tuas mãos (...) Tenho saudades da seda amarela tão leve, tão
suave, como se o sol andasse sobre o teu cabelo, a polvilhá-lo de oiro. Minha
linda seda loira, como eu tenho vontade de te desfiar entre os meus dedos! Tu
tens-me feito feliz, como eu nunca tivera esperanças de o ser. Se um dia alguém
se julgar com direitos a perguntar-te o que fizeste de mim e da minha vida, tu
dize-lhe, meu amor, que fizeste de mim uma mulher e da minha vida um sonho bom;
podes dizer seja a quem for, a meu pai como a meu toda a gente é mais isolada ainda. Podes dizer-lhe que
eu tenho o direito de fazer da minha vida o que eu quiser, que até poderia
fazer dela o farrapo com que se varrem as ruas, mas que tu fizeste dela alguma
coisa de bom, de nobre e de útil, como nunca ninguém tinha pensado fazer.
Sinto-me nos teus braços defendida contra toda a gente e já não tenho medo que
toda a lama deste mundo me toque sequer.
Florbela Espanca, in "Correspondência (1920)"
Vila
Viçosa 1894 // 1930
Poetisa
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