OS NOSSOS ESCRITOS
TEXTOS AUTOBIOGRÁFICOS ELABORADOS PELAS ALUNAS DA DISCIPLINA
POESIA ELABORADA PELAS ALUNAS
POESIA, CONTOS E OUTROS TEXTOS TRABALHADOS NA AULA
sexta-feira, 15 de novembro de 2013
far far away: Baixas pressões
far far away: Baixas pressões: Por aqui, o cinzento desprende-se, vagaroso, das nuvens baixas, e cola-se-nos à alma. Andamos pardacentos, cabisbaixos. Deprimidos. Sabem o...
terça-feira, 12 de novembro de 2013
QUADRAS DE S. MARTINHO
![]() |
S. Martinho |
Castanhas quentinhas
No lume a estalar
P’lo São Martinho
Vou comer até me fartar.
No lume a estalar
P’lo São Martinho
Vou comer até me fartar.
A fogueira está acesa
As castanhas rachadas
Postas no lume quentinho
Não tarda já estão assadas.
As castanhas rachadas
Postas no lume quentinho
Não tarda já estão assadas.
Algumas estoiram no ar
E tudo fica contente
Toca a rir e a brincar
Chegam para toda a gente.
E tudo fica contente
Toca a rir e a brincar
Chegam para toda a gente.
Cá estão elas tão
loirinhas
Boas, quentes e tostadas
A cara, a roupa e as mãos
Vão ficar enfarruscadas.
Boas, quentes e tostadas
A cara, a roupa e as mãos
Vão ficar enfarruscadas.
Come-se
papas de milho
Romãs e
castanha assada,
Bebe-se
uns copos de vinho
E às tantas não se dá por
nada.
É dia de S. Martinho,
Dia de grande reinação
Há vinho novo fresquinho,
Castanha assada e animação
Dia 11 de Novembro
É o dia de S. Martinho
Come-se a castanha assada
E mais o caldo verdinho.
É o dia de S. Martinho
Come-se a castanha assada
E mais o caldo verdinho.
Todo
o dia a apanhar chuva
Coitado do vendedor!
Mas à beira das castanhas
Fica cheio de calor.
Coitado do vendedor!
Mas à beira das castanhas
Fica cheio de calor.
O S. Martinho está a chegar
A lareira vou acender
Para as castanhas assar
E contigo as comer.
A lareira vou acender
Para as castanhas assar
E contigo as comer.
Com
o frio a chegar
A natureza está-se a transformar
Os ouriços a abrir
Para as castanhas apanhar.
A natureza está-se a transformar
Os ouriços a abrir
Para as castanhas apanhar.
Diversos autores
PROVÉRBIOS SOBRE O S. MARTINHO
Provérbios - S. Martinho
· A cada bacorinho vem o seu S. Martinho.
· A cada porco vem o seu S. Martinho.
· Em dia de S. Martinho atesta e abatoca o teu vinho.
· Martinho bebe o vinho, deixa a água para o moinho.
· No dia de S. Martinho, fura o teu pipinho.
· No dia de S. Martinho, come-se castanhas e bebe-se vinho.
· No dia de S. Martinho, lume, castanhas e vinho.
· No dia de S. Martinho, mata o porquinho, abre o pipinho, põe-te mal com o teu vizinho. (sic.)
· No dia de S. Martinho, mata o teu porco, chega-te ao lume, assa castanhas e prova o teu vinho.
· No dia de S. Martinho, mata o teu porco e bebe o teu vinho.
· No dia de S. Martinho, vai à adega e prova o teu vinho.
· Pelo S. Martinho abatoca o pipinho.
· Pelo S. Martinho castanhas assadas, pão e vinho.
· Pelo S. Martinho mata o teu porquinho e semeia o teu cebolinho.
· Pelo S. Martinho nem nado nem no cabacinho.
· Pelo S. Martinho prova o teu vinho; ao cabo de um ano já não te faz dano.
· O Sete-Estrelo pelo S. Martinho, vai de bordo a bordinho; à meia-noite está a pino.
· São Martinho, bispo; São Martinho, papa; S. Martinho rapa.*
· Se o Inverno não erra o caminho, tê-lo-ei pelo S. Martinho.
· Se queres pasmar o teu vizinho, lavra, sacha e esterca pelo S. Martinho.
· Veräo de S. Martinho säo três dias e mais um bocadinho.
· Vindima em Outubro que o S. Martinho to dirá.
· A cada porco vem o seu S. Martinho.
· Em dia de S. Martinho atesta e abatoca o teu vinho.
· Martinho bebe o vinho, deixa a água para o moinho.
· No dia de S. Martinho, fura o teu pipinho.
· No dia de S. Martinho, come-se castanhas e bebe-se vinho.
· No dia de S. Martinho, lume, castanhas e vinho.
· No dia de S. Martinho, mata o porquinho, abre o pipinho, põe-te mal com o teu vizinho. (sic.)
· No dia de S. Martinho, mata o teu porco, chega-te ao lume, assa castanhas e prova o teu vinho.
· No dia de S. Martinho, mata o teu porco e bebe o teu vinho.
· No dia de S. Martinho, vai à adega e prova o teu vinho.
· Pelo S. Martinho abatoca o pipinho.
· Pelo S. Martinho castanhas assadas, pão e vinho.
· Pelo S. Martinho mata o teu porquinho e semeia o teu cebolinho.
· Pelo S. Martinho nem nado nem no cabacinho.
· Pelo S. Martinho prova o teu vinho; ao cabo de um ano já não te faz dano.
· O Sete-Estrelo pelo S. Martinho, vai de bordo a bordinho; à meia-noite está a pino.
· São Martinho, bispo; São Martinho, papa; S. Martinho rapa.*
· Se o Inverno não erra o caminho, tê-lo-ei pelo S. Martinho.
· Se queres pasmar o teu vizinho, lavra, sacha e esterca pelo S. Martinho.
· Veräo de S. Martinho säo três dias e mais um bocadinho.
· Vindima em Outubro que o S. Martinho to dirá.
S. MARTINHO
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S. Martinho |
SÃO
MARTINHO
Em
França, a expressão "Verão de S. Martinho" é associada ao facto
milagroso de terem florido as plantas, reverdecido as árvores e os pássaros
terem começado a cantar, à passagem do corpo do Santo, levado de barco de
Candes , onde falecera aos 81 anos, para Tours onde foi enterrado.
Relembrando
esse episódio existe até "O Caminho do Verão de São Martinho"- "Le Chemin de l'Été de la Saint
Martin"
São Martinho é também santo patrono dos alfaiates,
dos cavaleiros, dos pedintes, dos restauradores (hoteis, pensões,
restaurantes), dos produtores de vinho e dos alcoólicos reformados, dos
soldados... dos cavalos, dos gansos, e orago de uma série infindável de
localidades de Beli Benastir, na Croácia, a Buenos Aires, na Argentina , passando,
evidentemente, por numerosíssimas sítios de Norte a Sul de Portugal.
Acerca do assunto, escreve o conceituado etnólogo Ernesto Veiga de Oliveira (1910-1990) o seguinte: «O S. Martinho, como o dia de
Todos os Santos, é também uma ocasião de magustos, o que parece relacioná-lo
originariamente com o culto dos mortos (como as celebrações de Todos os Santos
e Fiéis Defuntos). Mas ele é hoje sobretudo a festa do vinho, a data em que se
inaugura o vinho novo, se atestam as pipas, celebrada em muitas partes com
procissões de bêbados de licenciosidade autorizada, parodiando cortejos
religiosos em versão báquica, que entram nas adegas, bebem e brincam livremente
e são a glorificação das figuras destacadas da bebedice local constituída em
burlescas irmandades. Por vezes uma dos homens, outra das mulheres, em alguns
casos a celebração fracciona-se em dois dias: o de S. Martinho para os homens e
o de Santa Bebiana para as mulheres (Beira Baixa). As pessoas dão aos
festeiros, vinho e castanhas. O S.
Martinho é também ocasião de matança de porco.» (in As Festas. Passeio pelo calendário,
Fundação Calouste Gulbenkian, 1987)
Lenda de S.
Martinho
Martinho
era um valente soldado romano que estava a regressar de Itália para a sua
terra, algures em França.
Num dia frio e tempestuoso de outono, montado no seu cavalo, estava a passar por um caminho, para atravessar uma serra muito alta, chamada Alpes, e, lá no alto, fazia muito frio, vento e mau tempo. Martinho estava agasalhado para aquela época: usava uma capa vermelha, que os soldados romanos normalmente usavam.
De repente, aparece-lhe um homem muito pobre, um mendigo, vestido com roupas muito velhas e rotas, cheio de fome e de frio, que lhe pediu uma esmola.
Infelizmente, Martinho não tinha nada para lhe dar. Então, pegou na espada, levantou-a e deu um golpe na sua capa. Cortou-a ao meio e deu metade ao pobre. Mais adiante, encontrou outro pobre homem cheio de frio e ofereceu-lhe a outra metade da capa. Sem agazalho continuou a sua viagem ao frio e ao vento. De repente, as nuvens e o mau tempo desapareceram. Parecia que era Verão! Os raios de Sol começaram a aquecer a terra e o bom tempo prolongou-se por cerca de três dias. Foi como uma recompensa de Deus a Martinho por ele ter sido bom.
É por isso que todos os anos, nesta altura do ano, no dia 11 de Novembro, mesmo sendo Outono, durante cerca de três dias o tempo fica melhor e mais quente: é o Verão de São Martinho.
http://smartinho.blogspot.pt/2006/11/o-dia-de-s-martinho-comemoraes-e.html
Num dia frio e tempestuoso de outono, montado no seu cavalo, estava a passar por um caminho, para atravessar uma serra muito alta, chamada Alpes, e, lá no alto, fazia muito frio, vento e mau tempo. Martinho estava agasalhado para aquela época: usava uma capa vermelha, que os soldados romanos normalmente usavam.
De repente, aparece-lhe um homem muito pobre, um mendigo, vestido com roupas muito velhas e rotas, cheio de fome e de frio, que lhe pediu uma esmola.
Infelizmente, Martinho não tinha nada para lhe dar. Então, pegou na espada, levantou-a e deu um golpe na sua capa. Cortou-a ao meio e deu metade ao pobre. Mais adiante, encontrou outro pobre homem cheio de frio e ofereceu-lhe a outra metade da capa. Sem agazalho continuou a sua viagem ao frio e ao vento. De repente, as nuvens e o mau tempo desapareceram. Parecia que era Verão! Os raios de Sol começaram a aquecer a terra e o bom tempo prolongou-se por cerca de três dias. Foi como uma recompensa de Deus a Martinho por ele ter sido bom.
É por isso que todos os anos, nesta altura do ano, no dia 11 de Novembro, mesmo sendo Outono, durante cerca de três dias o tempo fica melhor e mais quente: é o Verão de São Martinho.
http://smartinho.blogspot.pt/2006/11/o-dia-de-s-martinho-comemoraes-e.html
sexta-feira, 8 de novembro de 2013
AS JANELAS
As janelas da casa da
minha infância nunca me despertaram grande interesse. Há uma janela no quarto
de meus pais e outra na sala de jantar São pequenas, estreitas e ficam muito altas em relação ao chão, e por isso,
mandaram fazer uns estrados em madeira de 25 centímetros de altura por 30 de
largura, colocados nos vãos das janelas, para que mais facilmente se chegasse à
janela e se pudesse olhar cá para fora. As janelas não são airosas nem alegres,
e por isso, a luz que por elas entra não é muito forte, o que dá às duas
divisões um ar triste e pouco iluminado.
Quando queremos ver
algo que se passa na rua, temos que subir para o estrado, e de cima deste,
podemos então, olhar a rua. Isso, sempre fez que eu nunca gostasse daquelas
janelas. De dentro para fora, quando estamos sentados à camilha não vemos nada
do que se passa lá fora. Se ouvimos algum barulho diferente, então, lá temos
que subir para o estrado, abrir a janela e espreitar lá para fora. De fora para
dentro, vive-se a mesma situação, como são muito altas, ninguém pode vir e
espreitar à janela, não se vê nada cá para dentro.
Quando eu era muito
pequena, gostava de brincar com as minhas bonecas no estrado da janela da casa
de jantar, sentava-me ali e passava algum tempo entretida a brincar, mas não
muito tempo, porque aquele lugar não tinha sol e eu sentia-o um espaço escuro e
fechado...
Aos Domingos, as amigas
ou as primas da minha mãe vinham lanchar com ela, então depois do lanche, nas
tardes sem chuva, punham-se à janela, onde só cabem duas pessoas, e por isso
quando era mais gente, tinham que fazer à vez. Lembro-me de vê-las com os seus
melhores vestidos, muito bem penteadas e algumas delas, até se atreviam a pôr
um pouco de “rouge” ou de pó-de-arroz, mas nunca pintavam os lábios, pois isso
não era de “bom tom” numa senhora casada.
Quando eu tinha os meus
cinco ou seis anos de idade, veio para Casa Branca um casal, o Sr. Escobar que
era empregado de escritório do Sr. Martinho Rovisco e a D. Rosinha, uma jovem
mulher muito bonita, muito elegante, que vestia muito bem e se arranjava como
uma senhora da cidade. Penteava-se com uma linda trança que era o enlevo de
toda a gente, tinha uma cara muito bonita que as pinturas ajudavam a realçar.
Faziam um casal muito bonito, muito elegante, eram jovens e muito bem
dispostos. Tinham um filho, o Sérgio, que era da minha idade. Os meus pais
fizeram amizade com eles. Todas as tardes de Domingo, os três vinham para nossa
casa, onde lanchavam e jantavam. A minha mãe gostava imenso da companhia da D.
Rosinha que era mais evoluída que a maioria das amigas de minha mãe, e por isso
lhe dava muitos conselhos sobre as modas daquela estação, cremes para o rosto,
e até sugestões para se começarem a pintar... de culinária e sobre a decoração
da casa... lembro-me que nessa época a minha mãe começou a dar mais atenção à
maneira como se arranjava e começou a usar creme de beleza na cara.

ZUZU
A TITA
Quando eu tinha 2 anos
de idade, nasceu o meu irmão.
A Srª Margarida
Traquinas foi trabalhar para nossa casa nessa altura. Como eu era muito
pequenina comecei a chamar-lhe Tita e assim ficou para sempre.
A Tita era uma mulher
dos seus 50 anos, cara redonda e sorridente, olhos pequeninos num rosto
simpático e rechonchudo, com um carrapito no alto da cabeça, braços muito
roliços, de estatura média, mais para o baixo, e toda ela redondinha e pronta
para nos aconchegar sempre que eu ou o meu irmão precisávamos dos seus braços.
No quarto do meu irmão
havia duas camas, uma para ele e outra para a Tita. Há uma janela que liga este
quarto com o meu, e que se mantinha sempre aberta, não só para arejar o quarto
que é interior, mas também para que eu sentisse que podia chamá-la sempre que
precisava.
Assim, quando eu tinha
dor de dentes ou de ouvidos eu chamava a Tita para vir ao meu quarto, para me
dar algum medicamento. Quando os sonhos eram maus e acordava assustada com
algum pesadêlo chamava a Tita, muito aflita, para que ela viesse dormir comigo.
Ela, paciente e disponível, não reclamava pelo facto de a ter tirado do sono
reparador e ao meu pedido para se deitar comigo, ela nunca dizia que não.
Deitava-se junto de mim, procurava acalmar-me e em poucos segundos estávamos as
duas a dormir profundamente. Eu acordava-a do seu sono reparador , após um dia
de trabalho intenso. Era a Tita quem cozinhava para todos (cerca de 8 ou 9
pessoas diariamente) quem punha as mesas, quem lavava a louça e quem arrumava
tudo, lá em casa. Não me lembro de vê-la sentada durante o dia, andava sempre a
lidar, a fazer qualquer coisa. Apenas ao serão ela se sentava ao lume e
participava nas conversas da família, pois ela era para nós uma pessoa de
família.
O meu avô Perninhas
contava anedotas e ela começava a rir, a rir, levantava-se da cadeira onde
estava sentada, sempre a rir, a rir à gargalhada e depois começava a dizer:” Ai
que vou fazer xi-xi!! Ai que não me aguento!” e zás, ali mesmo, muitas vezes
fazia xi-xi, ou então conseguia correr para o quintal e sempre a rir, ia fazer
xi-xi no quintal. Nós, que ficávamos na cozinha ríamos a bandeiras despregadas
com toda aquela cena hilariante. E o meu avô muito feliz da vida por ter
conseguido que toda a audiência risse muito alto com as suas anedotas.
As recordações que
tenho dela, são fantásticas. Sempre vi aquela mulher risonha e bem disposta,
pronta a dar-nos o lanche, a calçar-nos a vestir-nos para irmos para a escola.
Não me lembro de a ver arreliada com as nossas embirrações, com as nossas
teimosias de crianças. Nunca lhe ouvi uma palavra mais agressiva ou áspera,
pelo contrário, quando a minha mãe me batia ou se zangava comigo por eu ter
feito alguma coisa que a minha mãe achava que não estava bem, a Tita ficava
muito nervosa por me ver chorar e muitas vezes vinha junto de mim, para me
ajudar a acalmar e para eu parar de chorar.
Ia para todo o lado
connosco. Assim, quando iamos de férias para a Nazaré, ela ia connosco e aí,
apesar de tomar conta da casa e de todos nós, ainda tinha tempo para ir à
praia, tomava conta de mim e do meu irmão e brincava connosco de uma maneira
divertida e alegre. Um ano, vinhamos nós a chegar da Nazaré, eu, a Tita e mais
não sei quem vinhamos na carroçaria da forguneta de meu pai, então quando
passávamos junto da casa da sua filha Maria, esta apareceu à porta, e a Tita
levantou-se muito agitada, e de braços no ar dizia: “Olha a minha Maria!! Olha
a minha Maria!! Oh Maria estamos a chegar!” e gritava para que a filha a visse,
então a forguneta fez uma curva e ela caiu em cima dos colchões e da tralha
toda que trazíamos de um mês de férias, ficou de pernas para o ar, com as saias
todas à cabeça. Foi uma risota e até ela se ria, com o seu riso fácil e alegre.
Conta-se outra
“história” muito engraçada da Tita, da qual eu tenho uma vaga ideia de ter
acontecido. Os meus pais, a minha tia Maria Zé e as minhas tias Adélia e
Marilena foram às festividades de Fátima no dia 13 de Maio, então levaram o meu
balde da praia para fazerem xi-xi, pois dormiam todos na carroçaria da
forguneta. Durante esses 2 ou 3 dias usaram o balde para as suas necessidades
fisiológicas. Quando chegaram a Casa Branca, foram todos jantar e no fim do
jantar a Tita pôs a fruta dentro do dito balde em cima da mesa do jantar. A
minha mãe muito preocupada disse: “Oh Srª Margarida, nós fizemos aí xi-xi
durantes os dias em que estivemos em Fátima!!” e ela muito pronta disse: “ Oh
minha senhora não faz mal, está bem lavado, lavei-o na água da louça!!” bem foi
uma risota à mesa, que ninguém conseguia parar de rir. Ainda hoje se conta esta
história verdadeiramente hilariante.
Uma outra história da
Tita é esta; ela e o meu irmão que teria uns 4 ou 5 anos, foram à noite fazer
xi-xi ao quintal. Ela baixou-se para fazer xi-xi e saiu um pum. O meu irmão
perguntou: “Oh Tita que barulho é este?!” e ela muito rápida respondeu:” É uma
motorizada que vai a passar na rua!!”
Muitas e muitas mais
histórias haveria para contar desta mulher simples, meiga, que entrou na nossa
família para sempre e que nos deixou recordações muito, muito boas.
Deixou-nos quando eu
tinha 11 ou 12 anos. Foi tratar da sua mãe, doente e muito velhinha, que não
tinha mais ninguém que pudesse tratar dela. Eu ia visitá-la a casa da filha,
onde viviam umas 10 pessoas, e lembro-me de vê-la triste, preocupada e com um
olhar nostáligo, pois as saudades de nossa casa eram imensas. A casa era muito
pobre, não tinha nada de conforto, e a pobreza naquele tempo era muito má, pois
não havia reformas nem pensões de velhice. Um dia, fui vê-la e a mãe dela estava
muito muito doente, e ela disse-me que a mãe estava muito mal, quase a morrer.
Então fomos ao quarto e ouvimos o último suspiro da velhinha. Acabara de
morrer. Ela muito triste e muito preocupada comigo, pediu-me que me fosse
embora, pois não era ambiente para mim.
A Tita já não voltou
para nossa casa, ficou a ajudar a filha Maria que tinha muitos filhos. Quando a
Tita saiu de nossa casa, veio para nossa casa a sua neta a Maria Margarida,
filha da sua filha Maria que esteve connosco até casar. Foi outro tempo
maravilhoso, pois a Maria Margarida trouxe para a nossa casa a irreverência da
sua juventude, a sua alegria e boa disposição. Foram anos de muitas alegrias,
muitas partidas de Carnaval, muita risota e muita gente nova que entrava e saía
de nossa casa, pois ela tinha muitas amigas.
Eu estava uma
adolescente muito crescida e desenvolvida. O peito crescia-me todos os dias e a
minha mãe não me queria comprar um soutien porque eu ainda era muito miúda para
usar soutien!! Eu pedia à minha mãe que me comprasse um porque quando corria me doía o
peito. Então a Maria Margarida foi buscar um soutien da minha mãe vestiu-mo e com
uma agulha e linha, começou a fazer pregas, e mais pregas, e ajustou-mo ao meu
corpo magro de adolescente. Assim eu já podia correr sem que as maminhas
chocalhassem e me doessem... a minha mãe não teve outro remédio senão concordar
que eu precisava de um soutien...
Zuzu
CORREDOR DA CASA DA AVÓ BÁRBARA
O corredor era
comprido, muito comprido mesmo, proporcional ao meu medo do escuro. Saía-se da
porta da cozinha e entrava-se no corredor. Tínhamos que ir para a esquerda
quando íamos para os quartos, pois à direita ficava a porta do quintal. Eu ia dormir com a minha avó Bárbara, quando
a afilhada, que ia lá dormir com ela, não podia. Não era muitas vezes, mas
foram as vezes suficientes para eu ir e achar aquela casa grande e escura,
cheia de mistérios, ruídos e sombras; ali,
a noite era passada com sobressaltos, ao contrário da noite tranquila
que eu teria se dormisse em casa de meus pais.
Depois do serão muito
animado, com muita gente sentada à volta da lareira de casa de meus pais, eu e
a minha avó lá íamos muito agarradinhas uma à outra a caminho de sua casa. A
minha mãe ficava à porta com o cadeeiro a petróleo na mão, a tentar iluminar
alguma parte do caminho. A porta da casa da minha avó via-se da porta da minha
casa. A minha mãe esperava que nós entrássemos e metia-se para dentro. Quando
chegávamos junto da porta, a minha avó
começava a procurar a chave, uma chave grande, que facilmente se deveria
encontrar, mas que nunca estava no bolso onde a minha avó procurava, então
corria os bolsos todos e depois dizia: “Ai filha!!! Temos que voltar para trás,
temos que ir à casa da tua mãe, pois deixei lá a chave!!!”
Então, eu já cheia de
medo e aborrecida com aquela cena que se repetia todos os dias, dizia-lhe: - “
Oh avó, veja lá bem!!! A chave deve estar aí nalgum bolso!!” . A minha avó
voltava a procurar e lá estava a chave!! A chave que nos abriria a porta que
dava para a loja há muito, muito tempo sem actividade. Nada tinha vida
ali, as prateleiras vazias, as gavetas
fechadas e vazias, o balcão sem mais nada em cima, senão o candeeiro a
petróleo, com a luz muito muito baixinha, que nos esperava.
Entrávamos e a minha
avó subia a luz do candeeiro, pegava-lhe e levantava o braço para dar mais luz,
uma luz soturna que projectava sombras fantasmagóricas pelas paredes. Eu ia
atrás dela, não muito confiante... e entrávamos no corredor comprido, com
portas muito altas e estreitas, pintadas de cinzento escuro. Ao fundo, era a
cozinha para onde nos dirigíamos. Atravessar o corredor era uma eternidade.
Quando entrávamos na
cozinha, a minha avó pousava o candeeiro na mesa e começava logo a mexer de um
lado para o outro. Ia ao fogão aquecer o caldo de farinha de trigo que tinha
feito pela manhã, ia à despensa buscar o saco imaculado do pão guardado no
armário da despensa, ia à gaveta dos talheres na mesa da cozinha buscar a faca
muito areada, que parecia de prata e cortava duas fatias finissimas a todo o
comprimento do pão, ia à casa de jantar, ao aparador de pedra mármore buscar a
tigela da marmelada, que tinha sido feita no tempo dos marmelos. Eu ia buscar
as tigelas ao armário de parede, onde estavam os cântaros e tirava as colheres
da gaveta dos talheres. Era um ritual. Tudo feito com muita calma, muita
tranquilidade, um silêncio quebrado apenas pelas poucas palavras trocadas entre
nós. A minha avó punha o caldo de farinha crua nas tigelas e sentadas
tranquilamente, comíamos e bebíamos aquele manjar dos deuses. Depois de
comermos, a minha avó pegava no candeeiro e íamos corredor fora, até à última
porta, a porta do quarto da minha avó. Havia duas camas, a cama de casal de
madeira onde dormia a minha avó e uma caminha pequena em ferro, onde dormia a
pessoa que lhe ia fazer companhia durante a noite. A minha avó colocava o
candeeiro em cima da cómoda alta, de grande gavetões. Começavamo-nos a despir e
as nossas sombras projectavam-se pelas paredes caiadas de branco do quarto,
criando um ambiente taciturno. As sombras dançavam na parede branca. Eu vestia
a camisa de dormir o mais rápido que podia, para me meter na cama, pois o
ambiente não me era muito agradável. A minha avó despia-se calmamente, vestia a
camisa de dormir de flanela às florinhas e depois preparava-se para se deitar.
Antes, levava o candeeiro, com a chama muito baixinha, para o corredor, onde
ficava aceso durante toda a noite, e que dava ao quarto uma luz muito difusa de
presença. Sentada na cama, já pronta para se deitar, enrolava um xaile preto,
já velho, nos joelhos e com muito cuidado para não o desenrolar, metia-se entre
os lençóis e cobertores. Por vezes, ainda punha outro xaile velho nos ombros e
depois então, com muito cuidado é que se deitava. Eu admirava da minha cama,
aquele ritual diário do deitar, pois em minha casa ninguém tinha problemas de
dores nos joelhos nem frio nos ombros, e por isso, todos nos deitávamos sem
grandes preparos.
De vez em quando,
chegava ao quarto um som cavo e difuso, que me assustava e que a minha avó
imediatamente dizia: “ São as betas da prima Maria Ezequiel a raspar no chão. O
ti Manel deve estar a dar-lhe de comer!!”. Outras vezes, ouviam-se passos muito
próximo da janela, eram os homens que saíam do lagar no turno da meia-noite e
outros que iam entrar no turno seguinte. Os passos ecoavam no quarto muito nítidos e sonoros, por vezes, ouviam-se
vozes abafadas, tosses cavernosas e o pigarro nas gargantas do tabaco de
onça.
Naquele quarto não nos
sentíamos isolados do mundo, pois ruídos vindos de todos os lados, emprestavam
ao ambiente uma aura de mistério, de medo e ao mesmo tempo de companhia.
A PORTA DE ENTRADA DA CASA
A porta de entrada da
casa onde vivi desde um ano de idade até à minha adolescência é uma porta em
madeira, envernizada, de duas partes, que abrem ao meio. Tem um postigo de cada
lado, com postigos de vidro, que se podem abrir nos dias quentes de verão ou quando
queríamos saber quem é que nos estava a bater à porta, a horas tardias. Os
postigos são protegidos com grades em ferro forjado que lhe dão uma certa majestade Por cima, tem uma “bandeira” com uma grade em ferro forjado, por
onde entra a luz do sol .
Há noite, os ferrolhos
de cima e de baixo são puxados para que haja segurança, e nos sintamos seguros
dentro da casa.
A fechadura é já de pique-porte.
Por isso a chave é uma chave pequena, que abre com alguma dificuldade a porta.
Tem que se dar um certo jeito, para que a fechadura se abra, sempre a conheci
assim...
Quando alguém quer
entrar em casa, bate num batente em forma de “mãozinha”, cujas pancadas ecoam
por toda a casa.
Não é uma porta muito
larga, até posso dizer que é estreita, pois quando queremos passar, de verão
ainda se abre razoavelmente, mas de Inverno, como empena, fica uma fresta por
onde temos que nos esgueirar e apertar para podermos entrar ou sair da casa.
Esta porta da casa dos meus pais só era usada de
manhã muito cedo, à noite ou durante o fim-de-semana, pois todos as
pessoas que queriam entrar ou sair da
casa iam pela porta da loja, que estava sempre aberta, desde as 9 horas da
manhã até às 21 horas, hora a que se fechava definitivamente a porta da loja,
depois de se varrer e se lavar o chão.
Logo muito cedo, pelas
7 horas da manhã, batia a leiteira à porta, e a minha Tita ia abrir e receber o
leite no fervedor; o leite era transportado num cântaro de lata e era medido com
uma das medidas também de lata que a leiteira transportava presas umas às
outras por um cordel. Ela enchia a medida, que normalmente era a de 1 litro, e
com muito cuidado para não entornar uma gota sequer, vertia o leite para dentro
do fervedor de alumínio, que era enorme, devia levar 1,5 litro ou 2 litros, pois
como éramos muitos lá em casa, sempre gastámos bastante leite. Por vezes, as
vacas não davam tanto leite como era habitual e a Srª Maria Chica só nos
dispensava ¾ de litro, para grande arrelia da minha mãe, que queria que todos
nós bebêssemos um copo de leite ao pequeno-almoço. O leite era muito forte,
tinha sempre muita nata, e por mais que se passasse com o passador, passava
sempre para a caneca alguma gordura que sempre me agoniou imenso, ainda hoje
detesto a nata do leite.
A porta tem uma caixa
para o correio, com uma tampa em ferro que protege a caixa de madeira para onde
caem as cartas, quando o carteiro as enfiava na ranhura da caixa de correio. A
maioria das vezes, o carteiro ia entregar a correspondência à loja, pois como
esta estava aberta e havia sempre alguém para recebê-lo, a minha mãe ou um
empregado, o correio era entregue em mão.
A soleira ou portado,
tinha uma pedra mármore branquíssima, que era esfregada todos os dias, assim
como a rua era varrida todos ops dias, logo pela manhã. A pedras com o uso
excessivo começou a ficar desgastada e a fazer uma grande curva por onde
entrava muito pó; então, a minha mãe teve a ideia de colocar por cima dessa
pedra uma outra pedra mármore e assim ficaram duas pedras em cima uma da outra
o que obrigou o portado a subir. Quando vou a entrar ou a sair esbarro sempre
nas pedras, pois no meu inconsciente ainda só lá se encontra a primitiva pedra
mármore branquíssima Fico sempre irritada quando tenho que passar por lá, pois
para além de esbarrar na pedra, também a porta não se abre completamente por
estar empenada e é com algum esforço que passamos pelo espaço que a porta nos
deixa abrir.
Está velha, tudo está
velho, a porta, a casa e até os meus pais que eu recordo com imensa saudade
ainda jovens, à porta da rua a verem-me a mim e ao meu irmão a andar de
bicicleta e a brincar com os amigos e vizinhos da rua. Como eu me lembro da
alegria no interior da casa, quando se ouviam as pancadas da “mãozinha” e
sabíamos que vinham a chegar os tios e as primas de Estremoz. Os carros ficavam
do outro lado da rua, no recanto que ainda hoje lá existe, junto à casa do
prima Maria Inácia, e nós íamos numa enorme excitação abrir a porta, às visitas
que vinha almoçar, lanchar ou simplesmente passar a tarde, que terminava sempre
com um lanche na mesa de pedra mármore do alpendre ou do quintal.
Quando eu era pequena,
adorava andar descalça no alcatrão a escaladar da rua, então descalçava as
sandálias, colocava-as atrás da porta e lá ia eu toda contente jogar ao avião,
á apanhada ou ao às 5 pedrinhas . Andar descalça dava-me uma enorme sensação de
liberdade. Quando a minha mãe via as sandálias atrás da porta, chamava-me muito
zangada e alguma vezes, apanhei no rabo,
por ter aquela mania de me descalçar. No verão, o chão das diversas dependências
da casa era de cimento vermelho, de mosaicos por isso era muito fresco, eu
adorava andar descalça, mas nunca me deixavam porque podia ficar com anginas. A
minha vontade de andar descalça levou-me muitas vezes a levar uns sopapos da
minha mãe, que tinha uma verdadeira paranóia quando me via descalça, pois
segundo ela podíamo-nos constipar. Fui de tal maneira repreendida que hoje não
sei andar descalça em casa. Mal tomo banho enfio logo uns chinelos e quando me
levanto da cama tenho logo ali uns chinelos para calçar, mas descalça é que eu
não sou capaz de andar!!!!
Zuzu
Zuzu
RITA, MULHER DE CORAGEM E FORÇA
Vitalino e Amélia |
Rita
tem 85 anos. Olha-se no espelho e não aceita a velhice; está lúcida e faladora
como sempre. O seu corpo encolheu quase 50 centímetros; a mulher elegante, esbelta e magra que sempre
foi, tornou-se numa velhinha de costas encurvadas, muito enrolada, com enorme
dificuldade em chegar a tudo que esteja a mais de meio metro dos seus braços. Todos
os movimentos diários que é obrigada a
fazer, como pentear-se, vestir-se, tomar banho, limpar-se, vestir os collants e calçar os chinelos
tudo isso é feito com enorme sofrimento, esforço e dificuldade. As pernas fracas não a deixam
caminhar nem passear como sempre gostou. Olha-se no espelho e questiona-se como
é que chegou a este ponto!? Como é que em pleno século XXI, ninguém descobriu
ou não houve um tratamento para que isto não lhe acontecesse a ela!!! Ela que tanto gostava da sua figura bonita, de grandes olhos meigos, rosto perfeito, na
boca de lindos dentes brancos e direitos, o sorriso inconfundível sereno, meigo
...
Os
desgostos ao longo da sua vida, tão em quantidade quanto as alegrias ( a
falência e a necessidade de toda a família partir da aldeia para Lisboa,
procurar uma novo modo de vida, a morte do sogro, a morte da sogra, a morte da
mãe, a ida do filho para a guerra do ultramar, a morte da neta) , foram-se
alojando em cima das suas costas. Camada a camada foram carregando, carregando,
até que a tornaram numa velhinha encolhida, pequenina, sem um resquício do que
foi Rita, que sempre teve vaidade na sua esbelta figura.
Rita
nasceu no seio de uma família de comerciantes, onde não havia dificuldades
económicas, pois o pai sempre procurou dar-lhes todo o conforto e bem estar que
necessitavam. Mas, com oito anos, ficou orfã de pai. Quando o pai morreu com 38
anos, a mãe já tinha tido sete
gravidezes e estava grávida de 5 meses. Quando a bébé nasceu ficaram a viver na
grande e acolhedora casa a mãe, a Rita e
mais 4 irmãos ( dois irmãos tinham morrido antes da morte do pai, uma bébé com
ano e meio e outro à nascença). Ela era a mais velha, por isso, mal acabou a
instrução primária, ficou em casa onde ajudava com maneiras de menina crescida,
nas lides domésticas e na loja.
A
família sempre tinha vivido com os ganhos do estabelecimento comercial que o
pai explorava, tinham o depósito do tabaco que fornecia toda a aldeia e os
montes vizinhos; na loja vendia-se de tudo, desde os principais bens de
consumo, fazendas, roupa interior, calçado, petróleo, materiais de construção
como pregos, ferramentas e todos as alfaias agrícolas, de que os trabalhadores
rurais precisavam para trabalhar no campo, enxadas, foices, sachos, chapéus de
palha, etc. etc... Naquela loja fornecida com mercadorias encomendadas aos
caixeiros viajantes, das casas comerciais das principais cidades, os clientes
podiam encontrar tudo o que necessitavam, pois vendia-se de tudo, como era
hábito na província.
Depois
da morte do pai, Rita sabia que a vida nunca mais seria a mesma, pois era o pai
quem orientava os negócios, quem comprava e vendia e tinha um grande espírito
empreendedor. Era um homem que tinha ambições, que sabia que a vida naquela
pequena aldeia onde a maioria da população era formada por gente analfabeta,
que trabalhava nos campos, de pequenos seareiros e meia dúzia de homens ricos,
que davam trabalho nas suas herdades à grande maioria da população, não era a
vida que ele desejava para os seus filhos. Muitas vezes dizia para a mãe de
Rita que queria trabalhar muito, para poder ter dinheiro afim de dar um curso
aos filhos; assim os filhos poderiam sair da aldeia, para irem trabalhar nas
profissões que escolhessem, para terem uma vida futura mais equilibrada e
desafogada. Mas quando lhe surgiu aquele acidente vascular, tanto ele como a
mulher começaram a perder as esperanças de que isso pudesse vir a acontecer.
Estávamos
em 1938, início da 2ª Guerra Mundial. Depois da morte do pai, a mãe era o pilar
da casa. Cuidou, tratou e educou os filhos o melhor que pôde e soube. Deu-lhes
muito amor e muito carinho, e ao mesmo tempo uma educação rígida. Mas aqueles tempos
eram tempos difíceis. A mãe começou a não poder encomendar e comprar tanta
mercadoria como no tempo do pai. As prateleiras da loja começaram a ficar mais
vazias, os fregueses iam comprar a outro lado, e aqueles que continuavam fiéis
compravam muito pouco e muitas vezes fiado. Pouco a pouco, a família começou a
sentir algumas dificuldades. Despediram a criada que tinham a tempo inteiro, a
dormir e a comer, pois Rita já estava crescidinha o suficiente para tomar conta
dos irmãos e da casa, enquanto a mãe ficava a trabalhar na loja. Os irmãos
vinham da escola e ajudavam a mãe na loja. Assim, iam vivendo e crescendo...
Quando
tinha 12 anos, Rita pediu à mãe que a deixasse ir tirar o corte de costura,
depois de muita insistência dela, a mãe
deixou, mas a mãe foi criticada pela família, por Rita ser ainda muito nova
para tamanha responsabilidade. Mas a sua força de vontade, a sua capacidade de
aprender foram mais fortes e com 14 anos Rita já costurava para toda a família.
Fazia os vestidos, as saias, as combinações, os casacos compridos tanto para a
mãe como para as irmãs; para os irmãos fazia-lhes as camisas, os pijamas, as
calças que eram cortadas no alfaiate e cozidas por ela, os casacos. Começou
também a fazer camisolas de malha para todos lá de casa. Aprendeu a cozinhar
aos poucos foi-se tornando numa pequena dona de casa. Rita cresceu e tornou-se numa mulherzinha
muito responsável, era muito desenvolvida fisica e intelectualmente para a
idade e quando a mãe tinha momentos de desânimo, pois a vida não estava a ser nada
fácil, ela sempre lhe dava coragem e força para continuar.
Quando
tinha 12 anos começou a namoriscar o rapaz que mais tarde foi o seu marido. Quando
a mãe de Rita desconfiava que ela estava à porta a espreitar o namorado, mandava-a
imediatamente para dentro e muitas vezes lhe bateu, por ela “andar de cabeça no
ar!” e começar a pensar “em namoro” ainda tão nova!.
Como a mãe era viúva, não saía de casa, ( era
assim a vida de uma viúva numa aldeia! ) , então Rita quando queria ir aos
bailes tinha que pedir e insistir com a tia Alice para que fosse com ela, pois
caso contrário, a mãe não a deixava ir com mais ninguém. Quando havia cinema ou
circo na aldeia, Rita ia com os irmãos que já eram crescidos para lhe fazerem
companhia. Passear com as amigas era só em dias de festa ou em dias especiais.
Todo o tempo era para trabalhar em casa.
Quando
Rita tinha 18 anos, a irmã do meio, com 13 anos, começou a ficar doente. Cada vez estava mais
doente. Estava de cama, muito debilitada, muito mal. Rita acompanhou-a e deu-lhe toda a assistência, até que esta
acabou por morrer de tuberculose. Era Rita quem lhe preparava as refeições,
quem a tratava, quem lhe dava todo o carinho que a irmã precisava, pois a mãe,
depois de tantos desgostos estava muito, mas muito em baixo psicologicamente.
Mais uma vez, naquela casa entrou a tristeza, o desânimo, mas todos esses
incidentes fizeram com que a família ficasse cada vez mais unida. Os filhos
adoravam aquela mãe coragem que tanto sacrificou para que nada lhes faltasse.
Rita,
casou com 20 anos. Sabia que a esperava uma vida de trabalho, o marido tinha
comércio e para ela estava destinado o trabalho na loja, o trabalho na
salsicharia, o criar os dois filhos, o dar assistência à casa e à família,
sempre, mas sempre com um lindo sorriso naquela boca de romã, decorada com os
seus dentes alvos a sobressaírem do vermelho natural dos belos lábios...
Zuzu
Zuzu
quinta-feira, 7 de novembro de 2013
OS DEZ ANÕEZINHOS DA TIA VERDE-ÁGUA
Era uma mulher casada,
mas que se dava muito mal com o marido, porque não trabalhava nem tinha ordem
no governo da casa; começava uma coisa e logo passava para outra, tudo ficava
em meio, de maneira que quando o marido vinha para casa nem tinha o jantar
feito, e à noite nem água para lavar os pés nem a cama arranjada. As coisas
foram assim, até que o homem lhe a ralhar e a bater, e ela a passar muito má
vida. A mulher andava triste por o homem lhe bater, e tinha uma vizinha a quem
se foi queixar. Era mulher idosa e muito sábia, e dizia-se que as fadas a ajudavam. Chamavam-lhe
a Tia Verde-Água:
– Ai, Tia! vocemecê é
que me podia valer nesta aflição.
– Pois sim, filha; eu
tenho dez anõezinhos muito trabalhadores, e mando-tos para tua casa para te
ajudarem.
E a velha começou a
explicar-lhe o que devia fazer para que os dez anõezinhos a ajudassem:
- que quando pela manhã
se levantasse fizesse logo a cama, em seguida acendesse o lume; depois enchesse
o cântaro de água, varresse a casa, remendasse a roupa, e no intervalo em que cozinhasse o jantar fosse dobando as suas
meadas, até o marido chegar. Foi-lhe assim indicando o que havia de fazer, que
em tudo isto seria ajudada, sem ela o sentir, pelos dez anõezinhos.
A mulher assim o fez, e
se bem o fez melhor lhe saiu. Logo à boca da noite foi a casa da Tia Verde-Água
agradecer-lhe o ter-lhe mandado os dez anõezinhos, que ela não viu nem sentiu, mas o trabalho lhe tinha corrido
como por encanto.
Foram-se assim passando
as coisas, e o marido estava pasmado por ver a mulher tornar-se tão
arranjadeira e asseada;
Ao fim de oito dias,
ele não se conteve que não lhe dissesse como ela estava outra mulher, e que assim
viveriam como Deus com os anjos. A mulher contente por se ver agora feliz, e
mesmo porque o ordenado chegava para todo o mês, vai a casa da Tia Verde-Água
agradecer-lhe o favor que lhe fez:
– Ai, minha Tia, os
seus dez anõezinhos fizeram-me um servição; trago agora tudo arranjado, e o meu
homem anda muito meu amigo. O que lhe eu pedia agora é que mos deixasse lá
ficar.
A velha respondeu-lhe:
– Deixo, deixo. Pois tu
ainda não viste os dez anõezinhos?
– Ainda não; o que eu
queria era vê-los.
– Não sejas tola; se tu
queres vê-los olha para as tuas mãos, e os teus dedos é que são os dez anõezinhos.
A mulher compreendeu a lição,
e foi para casa satisfeita consigo por saber como é que se faz um bom trabalho.
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