OS NOSSOS ESCRITOS

TEXTOS AUTOBIOGRÁFICOS ELABORADOS PELAS ALUNAS DA DISCIPLINA
POESIA ELABORADA PELAS ALUNAS
POESIA, CONTOS E OUTROS TEXTOS TRABALHADOS NA AULA

terça-feira, 11 de novembro de 2014

A CASA



A casa foi construída em 1900 . Está situada numa rua larga e sem curvas, no meio de outras casas. Situa-se na zona dos Forais Novos, que é um zona de Casa Branca que foi construída nos finais do século XIX e inicio do século  XX. A aldeia precisava de crescer, assim a parte velha da aldeia ficou sendo a zona de Baixo ( eu moro lá em Baixo) depois da fonte e do tanque público de lavar roupa, e a zona nova passou a chamar-se ( de Cima) . Muitas das chaminés ainda têm a data de construção e há bastantes com a data de 1895.

 O Conde Nova Goa, dono do Lameirão, uma das maiores herdades junto a Casa Branca, doou o terreno, em foral que foi dividido em lotes. As ruas são todas paralelas umas às outras e as travessas dividem-nas formando quarteirões. Ruas largas, com uma construção muito idêntica ao estilo de Pombalino, As pessoas compraram os seus lotes de terreno e conforme as suas posses construíram as suas casas. Havia casas muito humildes, de construção de adobe e de caliça ( que era tirada do subsolo do quintal), baixinhas, de telha vã, sem casa de banho, a sua grande maioria, com uma porta ao centro e uma janela de cada lado. Há muitas casas que têm um portão que dá para uma cocheira, onde era guardado o macho ou a mula do seareiro. 
As pessoas comprometeram-se a pagar o foral todos os anos, ao Conde do Lameirão  e fizeram-no religiosamente até à revolução do 25 de Abril.
Há três grande ruas principais, paralelas umas às outras: Rua Conde Nova Goa, Rua D. Guilhermina Anjos ( mulher do Conde de Nova Goa) e Rua Conde de Valença.
A casa fica na Rua D. Guilhermina Anjos. Foi uma casa que o meu avô comprou a uma barbeiro que se chamava Laranjo, então, quando nos referimos à casa dizemos: "as casas do Laranjo". Como os meus avós viviam na casa da Rua Conde de Valença, esta casa era alugada ou emprestada para pessoas que necessitavam de morar ali por curtos períodos de tempo.
A minha mãe andou a tirar o curso de corte e costura com uma senhora de Portalegre, que veio morar para esta casa, e aqui dava as aulas. 
Vários jovens casais montaram ali a sua primeira casa e tiveram ali o seu primeiro filho, os pais do Zé Moreira foram morar para aqui e o Zé Moreira ( que tem 70 e muitos anos) nasceu nesta casa. A minha tia Adozinda e o meu tio João também tiveram aqui a sua primeira casa, e o meu primo Manuel Joaquim ( que tem 73 anos) nasceu aqui. Os meus pais também vieram viver para cá e por isso um ano depois do casamento eu nasci aqui na casa ( tenho 66 anos). Todos nascemos no mesmo quarto; um quarto acanhado onde cabia uma mobília de quarto completa, cama de casal, duas mesas de cabeceira, uma cómoda,  um guarda fatos e uma arca para guardar os cobertores e as roupas de cama.  Tinha uma janela não muito grande que dava para o quintal, junto a um grande limoeiro, carregado de limões o ano inteiro
As divisões da casa eram pequenas, e o quintal enorme em proporção às divisões da casa.
Havia um corredor ao meio, empedrado, de grandes pedras de calçada,  onde era muito difícil caminhar, pois era abaulado. De um lado e do outro umas paredes baixas de cerca de 70 centímetros separavam a parte do quintal que era semeado . Sempre nos sentámos nessas paredes, que eram suficientemente largas para ali estarmos sentados a aproveitar o fresco da manhã ou da tarde. Do lado direito havia o poço, que abastecia de água fresca toda a casa, e do outro lado, frente ao poço o tanque onde se lavava a roupa. Havia árvores de fruto, sobretudo romãzeiras. 
O quintal era semeado com favas para serem comidas na Primavera. No quintal da casa do Laranjo sempre nasceram espontaneamente papoilas, grande papoilas, de grandes hastes e flores vermelhas, brancas ou cor de rosa. Eram lindíssimas, e quando secavam ficava a cabecinhas com as sementes que eu ia colher para brincar .
À entrada havia a casa de entrada espaçosa, com uma mesa de madeira de mogno ao centro, com um naperon e uma jarra de flores ao centro, também aí estava a máquina de costura, onde a minha avó cozia todas as tardes, a fazer os aventais, as ceroulas, as camisas, a aproveitar de lençóis já velhos para fazer panos da louça,  um quarto para os hóspedes do lado direito e a sala de jantar do lado esquerdo, uma sala acanhada, com móveis grandes e desproporcionados para o tamanho da sala que atravancavam o espaço. 
Da casa da entrada passava-se para a cozinha, pequena, com uma chaminé onde a minha avó fazia lume o ano inteiro, com uma mesa baixinha junto ao lume onde os meus avós comiam, e uma mesa muito pequenina com uma gaveta onde era guardado o queijo, os enchidos cozidos que sobraram do jantar do dia anterior, algum peixe frito, toucinho ou presunto. Do lado direito o quarto onde todos nascemos, e do lado esquerdo uma despensa, com uma salgadeira de cimento onde eram guardado o toucinho e os presuntos do porco morto em Janeiro, a talha do azeite para todo o ano, a tarefa de barro das azeitonas e um asado grande cheio de queijos de Niza, que o meu avô comprava a um casal que vinha vender os queijos de Niza a Casa Branca, e que ficavam durante dias hospedados na estalagem da Ti Jaquina Gata, ao lado da nossa casa . Na cozinha havia a porta que dava para o quintal.
O quintal da casa do Laranjo era muito engraçado, mal se saía da porta do quintal junto à parede da casa, de um lado e outro, havia uma barra alta, quase de um metro e meio de altura, onde nasceram dois limoeiros que davam limões todo o ano e onde a minha avó plantava flores muito bonitas, todo o ano aquelas barras estavam floridas.
Ao fundo, havia a casa do cavalo com uma manjedoura, onde o meu avô guardava o cavalo branco, que ele utilizava e montava diariamente para ir o monte. Na casa do cavalo, o meu avô mandou fazer uma retrete, que caso estranho  tinha uma tábua a toda a largura da casa de banho, com dois buracos ao lado um do outro, como se fosse possível duas pessoas estarem no mesmo momento sentadas a "fazer as suas necessidades" e a falarem calmamente como se estivessem sentadas num banco de jardim, sempre me intrigou aquela retrete com "duas sanitas". Os excrementos e o xixi caiam para o chiqueiro, e eram tapados com palha,  onde coabitavam um ou dois porcos a engordar para a matança do início do ano. 
O galinheiro estava no quintal da casa de meus pais. A minha avó Idalina tinha aí as galinhas, os galos e os galarispos, e ia a todo o momento dar-lhes de comer. Numa tigela de fogo de barro, já velha fazia a travia para as galinhas com as cascas das hortaliças cortadinhas em bocadinhos miúdinhos, com que fez a sopa, com as cascas das melancias e dos melões, misturadas com farelos e água. os animais deliciavam-se com este manjar! Nós gostávamos imenso de ir ao galinheiro buscar os ovos acabados de pôr,
A casa dos meus avós sempre teve uma certa magia para mim. Era pequena, não havia rebuliço nem movimento como na casa de meus pais, e quando eu ali chegava a minha avó e o meu avô estavam sempre calmamente a fazer qualquer tarefa, mas de uma maneira tranquila e feliz. Eu sempre me senti ali muito bem. Logo pela manhã, eu ia a casa da minha avó tomar o pequeno almoço. Na mesa baixinha junto do lume, onde uma chocolateira de barro mantinha água fervente todo o tempo. A minha avó colocava numa tigela um pouco de farinha Predilecta ou torrada, uma casquinha de limão, punha-se açucar amarelo e sempre a mexer ia deitando aos poucos a água a ferver, e eu deliciava-me com aquele caldo, feito instantaneamente, que  eu acompanhava com uma grande fatia de pão fresco da padaria do meu tio António Perninhas  e um grande bocado de rodela de queijo de Niza, outras vezes o pão era barrado com mel, das colmeias do monte, ou com marmelada feita pela minha avó com os marmelos do monte. 



Sem comentários:

Enviar um comentário