OS NOSSOS ESCRITOS

TEXTOS AUTOBIOGRÁFICOS ELABORADOS PELAS ALUNAS DA DISCIPLINA
POESIA ELABORADA PELAS ALUNAS
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terça-feira, 8 de março de 2016

O ANJINHO

A Zuzu esteve doente e só voltou às aulas na quarta feira  dia   10 de fevereiro               
Todos os anos costuma trazer-nos uma prendinha depois do Natal. Sempre a conheci assim, amiga de dar prendas mesmo sem motivo especial. Cumprindo a tradição trouxe para cada uma um lindo anjinho prateado . Todos eles tocavam um instrumento musical. O meu tocava flauta, mas havia os que tocavam violino, violoncelo, harpa e sei lá que mais. O que sei é que todos eles tocando seria uma orquestra celestial só digna mesmo de anjos do céu (perdoe-se a redundância)..'
O meu já lá está pendurado no meu cantinho mas, não sei se por se sentir só, não me dá música, pelo menos que eu ouça...



2 março 2016  biblioteca da Academia Sénior Estremoz

Onde não falta vontade existe sempre um caminho


Aqui está uma frase que se adapta que nem uma luva à Rita Bulhosa. Esta  menina dona de um radioso sorriso e de uma invejável inteligência foi vítima desde o seu nascimento de uma doença que lhe afetou os movimentos das pernas impedindo-a de andar como as outras crianças.
Teve a sorte de ter uns pais que não cruzaram os braços e lhe proporcionaram todos os tratamentos possíveis. Para além disso procuraram educá-la como uma criança normal que ela no fundo é.
Dessa educação brotou uma adolescente brilhante, alegre, descontraída e segura de si.  Sem complexos resolve, pela escrita e pela palavra, compartilhar com todos nós as suas dúvidas e, muito mais ainda, as suas certezas.

Dona de um elevado dom da palavra e da escrita consegue mostrar na perfeição a sua convicta vontade de nos transmitir como todos os dias vai derrubando obstáculos e fá-lo comuna alegria ,sempre com um sorriso na sua cara bonita que nos contagia e nos faz querer ouvir mais. 
Admira-me que uma menina de quinze anos num estilo sem mácula com as idéias tão bem estruturadas que nos leva a querer ler mais e mais...
Maria Helena Alves

25 de ABRIL de 1974

Este foi um dia há muito tempo esperado.
À altura dava aulas na Escola Secundária e seriam umas oito e pouco da manhã, já eu ia saindo às Portas de Santa Catarina, quando um carro parou a meu lado oferecendo-me boleia. Era o professor Vítor Trindade a quem eu disse que não valia a pena subir pois já estava perto da escola. Como insistisse, aceitei e mal me sentei dá -me a notícia: tinha havido uma revolução e as tropas estavam na rua em Lisboa.
Numa grande excitação entrámos na escola e na sala dos professores ia um grande burburinho. Ainda não se sabia ao certo qual a origem do movimento embora para mim houvesse só uma certeza: era o fim do fascismo que tínhamos aguentado durante quase cinquenta longos anos.
Lembro-me de ver o Dr Crujo , esfregando as mãos  talvez de satisfação , enquanto ia repetindo de grupo em grupo :  pode ser o  Kaulza de Arriaga, pode ser, não sabemos!
Nesse dia foi impensável dar aulas e apenas se abriram as salas para uma conversa informal com os alunos. Só a D Fátima insistiu numa aula normal para  grande descontentamento dos alunos.


Foi um dia inesquecível todos de ouvido à escuta não perdendo pitada das notícias que iam chegando pela rádio e televisão. Alguns jornais fizeram duas edições que se esgotaram num ápice!
Lembro-me depois, de passarmos o resto da tarde e da noite de ouvido à escuta no rádio e na televisão, seguindo todas as movimentações das tropas na capital.
Seguiram-se dias e meses de grande euforia e felicidade em que apenas estava em casa o tempo necessário para comer e dormir e pouco mais. Não havia manifestação onde não estivesse presente, as reuniões sucediam-se, os inúmeros comunicados eram esperados e lidos com sofreguidão . Compravam-se vários jornais por dia, República, Diário, Diário de Lisboa, Capital, etc..
Nada me podia escapar e lembro-me mesmo de dormir com dois ou três transístores no travesseiro para, a qualquer momento, poder ligar para as várias estações na altura dos noticiários.
A saída dos presos políticos foi um dos momentos altos desses dias.
A legalização do PCP, a criação do MDP onde fiz parte da comissão política com o dr. Patrício, a criação do MES onde estive filiada, as primeiras eleicões livres, foram liberdades que o 25 de Abril nos trouxe.
A  28 de Setembro a reacção quis mostrar os dentes mas não conseguiu passar.
Como em muitas localidades também também em Estremoz , nessa noite se fizeram barricadas, cortando a estrada. Eu estava lá e lembro-me de um episódio estranho em que não acreditaria se não estivesse presente.
Correu nesse dia o boato de que, num carro, tinha sido descoberto um caixão cheio de armas caso a que estaria associado o nome de Artur Agostinho.
Ora nessa noite estava eu entre muitos camaradas a fazer vistoria aos carros que passavam na estrada à procura de armas quando foi barrado um  carro de matrícula estrangeira, penso que suíca, que se revelou verdadeiramente suspeito : atrás do condutor seguia um caixão que ele se recusou a abrir. Ninguém teve dúvidas dado o tal boato que se ouvia e que nunca soube se tinha fundamento.
Mesmo depois de muito instado recusou-se a abrir ali o caixão.
Logo dali saíu um carro com alguns dos nossos que o escoltou até ao quartel para entregar o caso ao COPCON.
Revelou-se que era realmente um pobre desgraçado que resolvera dar sepultura à mulher na sua terra natal e se atrevera a passar fronteira clandestinamente ainda não percebo como. Naqueles tempos de liberdade a vigilância abrandara e tornava possíveis episódios insólitos  como este
Passaram-meses e a 11 de Novembro morreram muitas das minhas esperanças num mundo novo em que as desigualdades se esbatessem e onde todos gozassem das mesmas oportunidades. Um mundo novo onde ninguém passasse fome, onde todos tivessem acesso à saúde, ao ensino, ao trabalho e ao lazer.
Para além da liberdade, da abolição da censura, legalização dos partidos, libertação dos presos políticos,  Abril trouxe-nos o fim da guerra, que tantos mortos e estropiados causou.
Para mim foi um momento de libertação de um regime opressivo em que vivi quarenta longos anos. Os tempos que então vivi de alegrias constantes , de companheirismo, de absoluta liberdade foram os melhores da minha vida que me marcaram para sempre e estarão sempre vivos na minha memória.
Maria Helena Alves

CIGANOS

Ouvi há dias a crónica "o amor é" de Júlio Machado Vaz sobre a maneira como os ciganos foram e são tratados na Suécia. Foram esterilizados, impedidos de entrar no país, as suas crianças foram-lhes retiradas. Fiquei estupefacta pois, embora saiba da perseguição que esta etnia tem sofrido ao longo da história, nunca pensei que isto se pudesse passar na Suécia país que eu pensava ser um modelo de democracia.

Uma cigana que tinha sido convidada para a cerimónia em que o governo iria pedir desculpas públicas pela maneira como a etnia tinha sido tratada, foi impedida de entrar no hotel onde a cerimónia decorria. Pasme-se!!!
Como Júlio Machado Vaz falou da sua boa relação com ciganos também eu quero aqui dar testemunho do meu bom convívio com esta raça.
Tempos houve em que as crianças eram ameaçadas com o homem do saco ou "o cigano" sempre que se recusavam a comer a sopa. Qualquer briga, qualquer roubo tem como primeiros suspeitos os ciganos. No entanto a grande maioria dos crimes, rixas, desrespeito da lei nada têm com eles.
A minha convivência com os ciganos vem da minha infância. O meu pai teve durante muitos anos uma estalagem onde muitos deles tinham residência fixa.
Como tínhamos acesso pela horta era lá que, tanto eu como as minhas irmãs e primas, passávamos grande parte do nosso tempo e das nossas brincadeiras.
Sempre foram muito carinhosos connosco e algumas vezes fugi para ir comer com eles. Ainda hoje faço uma sopa a que chamo "grãos à cigana" que lá comia e de que gosto muito.
 Lembro-me que um dia, no meio duma briga, um deles abriu em cima da mesa de pedra uma navalha de ponta e mola. Eu estava presente e, na minha inocência, quis pegar a navalha para que não se ferissem. Fechou-se na minha mão apanhando-me um dedo de raspão. Ao verem o sangue logo ali a briga se acabou e era ver a aflição dos dois a quererem tratar-me da ferida e o medo de que o meu pai soubesse do sucedido.
Quando nasceu lá uma menina convidaram o meu irmão Aníbal e a minha prima Maria Inácia para padrinhos. Foi-lhe posto o nome de Donalda.
Depois deste são convívio nunca tive ideias pré concebidas como a maioria das pessoas têm sobre os ciganos. Há bons e maus como em todas as raças.
Como professora muitos foram os que passaram pela minha escola. Ainda hoje sou muito amiga de algumas dessas minhas alunas.
Tive uma acção de formação sobre minorias na escola: ciganos, africanos e estrangeiros de vários países .
Estivemos um mês na Cúria com muito bons professores que nos deram a conhecer as origens da etnia cigana e os seus costumes.
Como trabalho final apresentei um estudo sobre uma criança da nossa sala que contou para todos os colegas os hábitos da sua família, em dias de festa, casamentos e mortes. Ensinou-os a dançar e, pelo menos as raparigas aprenderam com ela alguns passos das suas danças tão características.
Durante muitos anos dei alfabetização a adultos e houve anos em que a sala se enchia apenas com pessoas dessa etnia. Alguns pertenciam a famílias que se odiavam mas todos acataram as minhas recomendações de que tudo isso ficava para lá da porta da sala de aula e nunca houve entre eles o mais leve atrito.
Alguns eram bastante inteligentes e aprenderam a ler com uma enorme facilidade. Um que me lembro, vinha sempre irrepreensívelmente vestido, depois de ter passado nos balneários públicos para tomar banho. O mesmo não se poderia dizer da maioria que traziam na pele e nas vestes a marca das péssimas condições em que viviam. Tinha havido mortes nas duas famílias e o luto era guardado, para além do preto com que se vestiam, com o cabelo e barba que nunca mais cortaram e um chapéu que nunca tiravam da cabeça.
No mercado, ainda hoje  encontro alguns desses alunos ou seus familiares que me vêm cumprimentar com muita simpatia.


Maria Helena Alves

sábado, 5 de março de 2016

Pantufa mais gorda

MA  RI.   AH   EL    EN   AF   AL  CÁ  TÔ  AL  VE    S
Ma    Mal/Manel /
Ri.    Rir /haveria/avaria/ trafaria/
Ah!
El.   Ela/ ele/ elevar/ Raquel
En.    Enganar/merenda/venda/emenda
Af.     Afã /afagar/afogar
Al.    Almoço /faltar/ almograve/fatal
Vê.    Houve/vento /velório/vela
S.    Plurais/situação &

O (MA)nel  ((RI)u-se nervoso  (AH) ! Mas (EL)e que t(EN)ha emenda.  (AF)ogar o anim(AL)!  (CA)lculem o gaia(TO)! Grande (S)afado!

Já há algum tempo que via a minha Pantufa mais gorda  mas levei uns dias a aperceber-me que me iria dar gatinhos.
Só poderia ficar com um e apressei-me a encontrar donos para os restantes.
Tudo bem planeado e hoje, logo de manhã encontrei em cima da cama das minhas filhas quatro gatinhos lindos como nunca vi outros. Apeteceu-me ficar com eles todos tal era a dificuldade da escolha. Havia um todo pretinho que me trouxe à memória a minha linda Sweety que fez as delícias das minhas filhas durante quase vinte anos. Seria este o escolhido sem sombra de dúvida.
A minha irmã que tinha uma reunião importante no Porto deixou-me cá o Manel ,um pimpolho de cinco anos vivo como só ele , que me punha a cabeça em água já há três dias. Ficou doidinho quando descobriu os gatos. Apanhava um para logo o largar e pegar noutro num absoluto desvario. Também ele se decidiu pelo preto e já não o largou. Bem lhe dizia eu que não se devia mexer nos gatinhos porque, como todos sabem, são enjeitados pela mãe... Nem me ouviu  e o gatinho preto tornou-se a sua companhia a partir dali.
Hoje, estava eu ocupada na cozinha despachando o almoço quando comecei a ouvir o riso nervoso do Manel de mistura com alguns soluços incontroláveis. Acorri num susto e, que vejo eu?
Na casa de banho, estava o meu amigo Manel dando banho ao seu gatinho. Tinha enchido de água o bidé e lá estava o Manel tentando reanimar sem sucesso o seu gatinho preferido
Com um sorriso soluçado foi explicando que apenas lhe queria dar banho porque ele era o mais sujo deles todos. (Todos tinham apenas umas leves manchas ao passo que ele era completamente preto...).
Meu rico gatinho. Afogar o animal!  Ah, grande safado!!!