OS NOSSOS ESCRITOS

TEXTOS AUTOBIOGRÁFICOS ELABORADOS PELAS ALUNAS DA DISCIPLINA
POESIA ELABORADA PELAS ALUNAS
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sábado, 5 de março de 2016

A RAPARIGA NAS NÚVENS

Porque não hei-de eu ser como as crianças ? A estas horas estão as minhas amigas passeando na feira de s. Mateus e eu aqui estou confinada a este quarto já vai para 10 dias. Tenho pouca saúde e já devia estar habituada pois até me parece que passo mais tempo aqui que lá fora. Mas não me resigno e com o passar dos anos mais cresce a minha revolta.
Hoje resolvi que havia de esquecer a minha má sorte e pensar em coisas alegres já que não  serve de nada estar para aqui a martirizar-me porque até me sobe a febre.
E foi assim que, na minha imaginação, vi concretizado o sonho da minha vida: passeava em Paris e era tal e qual como vira na televisão.
Cidade linda de edifícios monumentais, com o Sena um rio tranquilo com barcos cheios de turistas.  Tantas vezes tinha sonhado embarcar num deles como se também eu fosse uma turista cheia de posses a viajar pelo mundo.
E eis-me a correr mundo sem destino marcado como se fosse levada numa nuvem num passeio interminável. Os desertos sem fim de África, os cumes cobertos de neve dos Imalaias, a Patagónia que era tal e qual tinha lido num livro de viagens, a
Lapónia  onde tive a sorte de assistir ao mais belo espetáculo que verei em toda a minha vida. O céu iluminou-se com uma luz estranha e foi como se uma cortina esvoaçasse ao vento e fosse sendo pintada de lindas e variadas cores.
Ouço bater à porta e a cabeça da minha mãe assoma com a bandeja do lanche.
Que raiva! Não tenho fome e vieram perturbar a minha viagem que viera alegrar  a minha solidão...

Milena Alves

ACEITAR-ME A MIM PRÓPRIA

ACEITAR-ME A MIM PRÓPRIA 

O que é mais importante?
Aceitar-se a si próprio?
Sentir-se acoompanhado?
A comparação com os outros ?
O controlo dos sentimentos?
Os juízos que fazem a seu respeito?     

ACEITAR-ME A MIM PRÓPRIA 

Quando ouvi a frase dei-lhe um sentido que não seria o que a autora lhe quis dar. O meu texto vai basear-se nessa minha primeira impressão. 
Na minha adolescência e até já depois de adulta não teria grande amor próprIo. Fiz vários tratamentos para engordar pois durante anos fui extremamente magra e não aceitava o meu corpo Casei-me aos vinte e quatro anos com 40 kg e bem mais alta do que hoje sou.
A diretora do colégio e minha professora de português, escolheu-me algumas vezes para ir recitar talvez por achar que eu lia bem mas, chegada ao palco, era preciso empurrarem-me e mesmo assim só com muito custo me desenvencilhava da tarefa. Cheguei assim ao meu curso do magistério primário onde o diretor com quem mantinha uma relação de ódio, tentou fazer-me a vida negra e rebaixou-me durante os dois anos em que por lá andei. Nunca ninguém me perguntou o que queria eu seguir e assim fui empurrada para um curso que nunca escolheria. 
Convenci-me que a minha vida não permitia escolhas e incuti em mim mesma que talvez as minhas capacidades não fossem suficientes para atingir o que queria e acabei por nem tentar.
A partir daí foi um crescendo sempre na dúvida se seria capaz de levar a cabo qualquer tarefa mais difícil que me fosse proposta. A minha auto-estima estava muito baixa pois mesmo em minha casa constantemente comparavam as minhas capacidades intelectuais e não só, com a minha irmã. 
Quando fomos para o sexto ano, agora décimo, entrei cerca de mês e meio depois das aulas terem começado. Meti-me em brios, peguei nos livros da minha irmã e, estudando sozinha, consegui as melhores notas da turma. Isso melhorou muito a minha auto-estima e pensei que todas as pessoas eram capazes de desempenhar algumas tarefas mas não todas, conforme as aptidões de cada um.
Vi que era muito melhor que outras pessoas em alguns desempenhos            específicos mas que essas mesmas pessoas faziam coisas que eu nem me atreveria tentar
Este reconhecimento de mim mesmo foi-me abrindo a mente e, a pouco e pouco, aprendi a gostar mais de mim.
Hoje penso que pus fim a essas dúvidas e aceito-me tal como sou com as minhas limitações, aceitando o meu corpo aleijado, o andar com o nariz cada vez mais perto do chão, as minhas rugas e todos os "andycaps "próprios da idade.
Por vezes ainda sinto alguma raiva quando não consigo prosseguir na minha atividade preferida : pintura e desenho. As pessoas pensarão que é falsa modéstia ou baixa auto-estima mas não é uma coisa nem outra. 
O meu alvo está muito alto e, como o que consigo fazer não chega nem lá perto, resolvi desistir.  Não me interessa fazer o bonitinho, o mesmo parecido com o modelo, que fizera até aqui.
Chamem-me o que quiserem e talvez um dia continue no mesmo caminho que até aqui, nunca se sabe...
Nunca digas nunca!
Milena Alves

CHARLOT E OS LIVROS

Na gravura que me mostraram pareceu-me ver a figura do Charlot em equilíbrio em cima duma enorme pilha da livros que se eleva acima da cidade e das fábricas. Que conceito poderei eu retirar daqui?
O humor pode ser muito para além do que o comum das pessoas pensam. 
Charlot praticava um tipo de humor inteligente. Notava-se nele uma inteligência e uma cultura que contrastava com a sua figura de palhaço desastrado e vagabundo.
O humor que me faz rir é este. Humor feito por quem tem uma base cultural sólida. Temos o exemplo do Ricardo Araújo Pereira e os seus três companheiros, do Herman José ou     Serafim  entre outros poucos mais.
Todos eles  têm, para além da inteligência que se lhes reconhece, uma enorme cultura adquirida sobretudo nos muitos livros que foram lendo ao longo da vida.
Há depois os tais palhaços que muito se esforçam a contar umas anedotas sem graça ou já com cabelos brancos, que fazem rir salas cheias de basbaques no muito em voga "stand up".
 "Ler um livro é ler a vida" disse-me um dia um amigo a propósito de leitura.
É uma frase que me tocou particularmente pois em poucas palavras resume bem onde nos pode levar o contacto com os livros. Muitas vezes a cito às minhas alunas quando estou a tentar incutir-lhe o gosto pela leitura.
Maria Helena Alves

O AVÔ E O NETO

A gravura tinha um rapaz e um homem mais velho sentados em amena conversa com um semblante muito alegre.
Sem mesmo ver a gravura escrevi isto muito à pressa durante a hora de almoço para entregar na aula da Zuzu:

-Nem calculas como fiquei contente por te conseguir encontrar! Foi talvez melhor que me ter saído a sorte grande!
-Também eu avô ! Deixou-me era eu ainda um gaiato e nunca mais tivemos notícias suas.
-Sabes lá a minha vida! Saí daqui como já deves saber porque não me conseguia         governar. O lavrador que algumas vezes me deu trabalho tratava-nos pior que escravos. Ainda o sol não tinha despontado já lá estávamos a trabalhar no duro e só com uma pequena pausa para comer umas sopas que sonhavam com o azeite. Depois novamente ao trabalho até que o sol desaparecesse no horizonte e já não conseguíssemos fazer mais nada.
-Isso era na herdade do D. João, não era? A minha mãe falava-me muito nele e da maneira como a explorava a ela e a todas as companheiras.
Mas porque é que nunca mais nos disse nada?
-Quando daqui fui a minha vida também não foi um mar de rosas. Penei e corri muito até endireitar a minha vida. Tinha vergonha que na aldeia soubessem o que eu estava passando.
-Ó avô, o que nós queríamos era saber de si. Até pensámos se não teria morrido.
-Credo filho! Felizmente não foi esse o caso.
-Então porque não dava notícias?
-olha, quando consegui endireitar a minha vida escrevi várias cartas mas todas foram devolvidas. Assim passou algum tempo até que, já muito apoquentado resolvi escrever para a ti Zefa do Caco, que me   o que fora feito de vocês que nunca mais tinha tido notícias.
-Mas então porque é que ela não nos disse nada?
-Ó filho, o meu desgosto quando ela me mandou dizer da morte da tua mãe!
-Calculo. Tanto que o avô gostava dela!
-Se gostava! Ela foi a filha que nunca tive. Vi-a nascer e nesse mesmo
 dia ficar sem a mãe que morreu de parto . Acontecia muito naqueles tempos. Ajudei como pude na sua criação e ela pagou com amor o amor que eu lhe tinha.
Quando tu nasceste foste o meu primeiro e único neto.
-Já eu andava na escola quando os gaiatos me disseram que o avô não era o meu avô verdadeiro. Tive cá um desgosto! Fugi da aula e só me apanharam já era noite com toda a aldeia à minha busca.
-Mas a Zefa também me disse que tu tinhas tinhas saído para o estrangeiro e nunca mais souberam de ti.
Foi-me impossível encontrar-te e Deus sabe o que sofri.
- Tenho muita pena avô, mas também eu me vi obrigado como muitos dos meus colegas de curso a sair do país.
Foi uma alegria enorme, quando aqui cheguei depois de tanto anos por fora, saber que o avô tinha regressado à aldeia. Corri logo para aqui para lhe dar aquele abraço apertado tanto tempo adiado!

Maria Helena Alves

quarta-feira, 2 de março de 2016

O ANJINHO

A Zuzu esteve doente e só voltou às aulas na quarta feira  dia   10 de fevereiro               
Todos os anos costuma trazer-nos uma prendinha depois do Natal. Sempre a conheci assim, amiga de dar prendas mesmo sem motivo especial. Cumprindo a tradição trouxe para cada uma um lindo anjinho prateado . Todos eles tocavam um instrumento musical. O meu tocava flauta, mas havia os que tocavam violino, violoncelo, harpa e sei lá que mais. O que sei é que todos eles tocando seria uma orquestra celestial só digna mesmo de anjos do céu (perdoe-se a redundância)..'
O meu já lá está pendurado no meu cantinho mas, não sei se por se sentir só, não me dá música, pelo menos que eu ouça...

MILENA FALCATO

2 março biblioteca da escola

domingo, 13 de setembro de 2015

NOITE DE INSÓNIA



Não valeu de nada ter-me deitado mais tarde. Voltas e voltas na cama e nada de sono. Tateio no escuro para agarrar o relógio, ilumino-o: são quatro horas! Mais uma noite de insónia.
Cinco, seis, sete horas. Chegada aqui uma vontade premente faz-me saltar da cama. Azar! O Manel chegou primeiro e já ocupa a sanita.
(Ttenho que falar com a médica para lhe receitar um remédio mais potente que o faça dormir mais umas horas de manhã...)
Ainda consigo puxar de um bacio antes que o faça pelas pernas abaixo...
Com a casa de banho ocupada, ( e vai demorar...), que vou eu fazer?
Volto novamente para a cama na esperança de ainda dormir um pouquinho. Nada! Maldita insónia que, já vai para uma semana, me atormenta!
E está na hora de ir ajudá-lo a tomar banho!
Finalmente despachada, reparo que já são dez e um quarto.
Pequeno almoço engolido à pressa saio para a rua para umas compras e espairecer um pouco. Faz-me falta andar mas as dores são tantas que muitas vezes tenho receio de não conseguir regressar. Eu que era uma andarilha nata que tomava sempre a dianteira em qualquer passeio...
De volta a casa resolvi que era hoje que terminaria as bonecas que estou fazendo para a minha Leonor. Escusado! Alguém toca à porta. A minha amiga Lúcia vem trazer-me um presente. Traz-me um saco de figos da Índia descascados e prontos a comer sem sombra de picos. Deu-lhos o filho mas, como ela sabe que sou perdida por este petisco, resolveu que seria eu a comê-los. Em boa hora, pois eram deliciosos e, pela primeira vez, comi figos sem ficar com uma carrada de picos espalhada pelo corpo!
Comidos o figos de novo me agarro à costura. Mas, ainda não era desta! Tocam à porta novamente e, desta vez, era alguém a entregar uma encomenda que vinha à cobrança. Não tinha dinheiro em casa e ainda disse ao homem que, se pudesse esperar iria levantar dinheiro à Caixa mas, como o vi hesitante, toquei às três campainhas do prédio e, a que atendeu, emprestou-me o dinheiro.
Comprei, a meias com a Mina, uns apetrechos em gel de que faziam enorme reclame pela net. Usando aquilo, adeus joanetes!!!  Como estavam com preço de promoção resolvemos experimentar. Não consegui falar com ela e nem abri a encomenda. Depois se verá!
E assim se passou a manhã sem fazer nenhum...
Horas de almoço e foi um corrupio para fritar uns peixinhos minúsculos muito saborosos e fazer umas migas de espargos para acompanhar. Tinha dito à Lúcia que iria passar por casa dela mas tive de desistir. A minha filha vem hoje com os filhos e tenho que preparar jantar.
Ainda pus a máquina de costura em cima da mesa mas não lhe cheguei a mexer. Como os lisboetas estavam atrasados, dei de jantar ao Manel. Ainda fiz uns bifinhos e um puré de maçã para o nosso jantar porque só a sopa tinha ficado feita.
Chegaram e nem mesa posta nem jantar acabado!
Já tinha tantas saudades dos meus netinhos que não via há muito tempo... Estão enormes! Ele já fez a licenciatura em engenharia eletrotécnica e de computadores e ela depois de muitas indecisões matriculou-se este ano em biologia.
Às dez horas da noite estávamos finalmente sentados à mesa. Como tinha lanchado bem nem dei pelas horas...
Os gaiatos mal apanham a mesa disponível puxam do computador, põem uns auscultadores nos ouvidos e adeus conversa...
Eu aproveitei para escrever mais um pouco.
A minha netinha está linda e não me canso de olhar para ela !
Nenhum deles gosta de fotografias mas amanhã irei fazer algumas para compensar as grandes ausências. Sempre vou matando saudades olhando para elas...
Ele ficou até tarde no computador e eu fiz-lhe companhia. Quando dei por mim já passava das duas ! Vamos ver se amanhã não me deixarei dormir...


Ps- é o que fiz ontem à pressa e com muita conversa à volta. Não sei se serve. Bj
Maria Helena Alves, 82 anos